segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

És




Emendo-te rasuro-te preencho-te
assino-te destino-te comando-te
és o lugar concreto onde procuro
a noite de passagem o abrigo seguro
a hora de acordar que se diz ao porteiro
o tempo que não segue o tempo em que não duro
senão um dia inteiro.

Invento-te desbravo-te desvendo-te
surges letra por letra, película sonora,
do sentido à vogal do tema à consoante
sem presença no espaço sem diferença na hora.
És a rota da Índia o sarcasmo do vento
a cãibra do gajeiro o erro do sextante
o acaso a maré o mapa a descoberta
num novo continente itinerante
.

José Carlos Ary dos Santos






domingo, 30 de janeiro de 2011

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Apetece-me jurar-lhe

Diz-me que não estou enamorada,
às vezes apetece-me jurar-lhe
que esqueceria o sol entre os seus braços
ou quereria estar a beijar sempre
seus lábios ou que não me importa o tempo
ao olhar-me no escuro, fixo, louco.
Porém de que me serviria tanto?
Não acreditaria uma palavra.


Amália Bautista

sábado, 22 de janeiro de 2011

Quero dar-te



Quero dar-te a coisa mais pequenina que houver

bago de arroz

grão de areia

semente de linho

suspiro de pássaro

pedra de sal

som de regato

a coisa mais pequena do mundo

a sombra do meu nome

o peso do meu coração na tua pele.
Rosa Lobato Faria


sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Dias Assim

Nos dias em que se espera silêncio
Soletro-te onde tudo o que não é palavra é pele

Maria Sousa

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O aniversário do poeta

Impetuoso, o teu corpo é como um rio onde o meu se perde.
Se escuto, só oiço o teu rumor.
De mim, nem o sinal mais breve.
Imagem dos gestos que tracei, irrompe puro e completo.
Por isso, rio foi o nome que lhe dei.
E nele o céu fica mais perto

Eugénio de Andrade

Das minhas manhãs




Vivo com uma gata que não entende
que quase sempre as minhas manhãs pedem silêncio

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Com a noite




Mas tu nunca vinhas com a noite
E eu sentada com casaco de estrelas.…

Quando batiam à minha porta
Era o meu próprio coração.

Agora pendurado em todas as ombreiras,
Também na tua porta.

Entre touros rosa-de-fogo a extinguir-se
No castanho da grinalda.

Tingi-te o céu cor de amora
Com o sangue do meu coração.
Mas tu nunca vinhas com a noite…
E eu de pé com sapatos dourados.

Else Lasker-Schüler

domingo, 16 de janeiro de 2011

Lentamente



Agora eu era linda outra vez e tu existias e merecíamos noite inteira um tão grande amor
agora tu eras como o tempo despido dos dias, por fim vulnerável e nu,
E eu era por ti adentro eternamente
lentamente
como só lentamente se deve morrer de amor






Valter Hugo Mãe

sábado, 15 de janeiro de 2011

Sei



Sei que os campos imaginam as suas próprias rosas.
As pessoas imaginam os seus próprios campos de rosas.
E às vezes estou na frente dos campos como se morresse;
outras, como se agora somente eu pudesse acordar.
Herberto Helder

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Musicas perfeitas para o que não sabemos dizer

...Je t'inventerai

Des mots insensés

Que tu comprendras...

Dias Assim



Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.


Eugénio de Andrade

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Sem Palavras



Saber o que és, dizer o teu corpo, ouvir-te num breve instante, dizer o que é amor sem o dizer, tirar de mim um poema que te cante;
e ver passar-te por entre os dedos o fio de luz que prende os teus olhos, e vê-lo enrolar-se em segredos quando a tua voz o apaga e acende;
tocar-te os lábios num fim de verso, ver-te hesitar entre sorriso e mágoa, perguntar se o teu rosto tem reverso,
e ter nele uma transparência de água:
é o que vejo em ti no cair de véu em que me dás a terra que vale o céu.
Nuno Júdice

domingo, 9 de janeiro de 2011

Dias Assim


Num dia brancamente nublado
Entristeço quase a medo



Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)

sábado, 8 de janeiro de 2011

Sem escolhas


Escrevo como vivo, como amo, destruindo-me.
Suicido-me nas palavras.
Ruy Belo

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

O coração desafinado


O coração necessita de afinação, como os rádios.
Por vezes, em simultâneo, executamos duas canções,
e uma perturba a outra,
e não é bom para os ouvidos.
Mas qual o botão que afina o coração?
Não é assim tão fácil.





Gonçalo M. Tavares

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Esperas

No ponto onde o silencio e a solidão
Se cruzam com a noite e com o frio,
Esperei como quem espera em vão,
tão nítido e preciso era o vazio.











Sophia de Mello Breyner Andresen